Jornalista e escritora, Mariana Bueno é mineira, morou durante anos no Rio de Janeiro e atualmente chama o Espírito Santo de lar. Feminista, ela descobriu por acaso o prazer de viajar sozinha e não parou mais.

Das experiências pelo mundo, nasceu o blog Mariana Viaja, onde compartilha dicas para outras mulheres que querem se aventurar em uma viagem solo. Feminista e amante de livros, fotografias, doces e uma boa conversa, ela lançou recentemente seu primeiro livro e atualmente concorre ao Prêmio Nacional do Turismo na categoria imprensa – é possível votar através deste link.

Essa é a quarta entrevista da série “O mundo é delas“, em que nos propomos compartilhar histórias de mulheres incríveis que estão redefinindo o conceito de viagens de um jeito muito especial.

Aproveita para conferir também a entrevista sobre minimalismo e viagens com a Caroline Abreu, nossa conversa sobre turismo sustentável com a Ana Duék ou o papo sobre festivais de música com Gracielle Fonseca e Priscila Brito.

Viajar sozinha, por Mariana Bueno

Mariana Bueno conversando com Fernando Pessoa, em Lisboa, Portugal

Quanto Custa Viajar – Quando você começou a viajar sozinha e como foram suas primeiras experiências?

Mariana Bueno – Foi em 2013! E tudo muito por acaso, eu nunca tinha sequer cogitado viajar sozinha, embora já morasse sozinha no Rio de Janeiro, fora do meu estado natal (MG), e já estivesse habituada a fazer coisas sozinha. Mas viajar parecia loucura. Até que tive férias numa data em que ninguém conhecido ia ter… E, como já gostava muito de viajar, fiquei pensando no que valeria mais a pena. Aí resolvi encarar.

Escolhi ir para Havana, em Cuba, o que foi meio loucura porque é um destino superdiferente, na época sem internet, dificultando a comunicação. Mas era um lugar que eu tinha vontade e sempre adiava porque nunca ninguém queria ir. Fui e gostei da experiência. Claro que com vários altos e baixos, tinha dias que eu ficava triste por estar sozinha, outros já achava legal poder fazer as coisas do meu jeito sem ter mais ninguém.

Mariana em Havana, Cuba

O principal é que voltei ciente de que tinha descoberto mais uma forma de viajar, que não precisava esperar companhia. Na sequência, já comprei uma passagem para a Bahia e alguns meses depois fui sozinha para Salvador. A cada nova viagem eu fui me sentindo mais confortável. E não parei mais!

QCV – Na sua opinião, qual a principal diferença de ser uma mulher viajando sozinha pelo mundo?

Mariana – Acho que, se ainda existe essa diferença, é porque, de modo geral, nós mulheres não somos (ou pelo menos não éramos) incentivadas a desbravar o mundo, a fazer as coisas sozinhas, a desenvolvermos nossa coragem. Tem sempre aquilo de que mulher é mais frágil, mulher não pode, todo um padrão de comportamento no qual tentam sempre nos encaixar.

Então sair desse padrão já é uma vitória, entender que a gente pode é o primeiro passo. Porque as pessoas ainda olham torto, ainda julgam e os perigos são mesmo maiores. A gente não precisa ter cuidado “só” com assalto, por exemplo. A gente precisa ter cuidado com assédio, com abuso, com coisas mais graves.

Mariana em Curitiba, no Paraná

A mulher sozinha ainda é vista como uma presa fácil. Ainda é uma coisa diferente. Mas, por outro lado, ser uma mulher viajando sozinha pelo mundo é uma atitude que faz a diferença não só para quem está vivendo a experiência, mas abre caminho para tantas outras entenderem que também podem. Não é solidão, é independência!

QCV – Já viveu alguma situação desagradável ou se sentiu insegura durante uma viagem? Como se virou nesse caso?

Mariana – Nunca teve algum acontecimento ruim que tenha me marcado. Já me senti insegura inúmeras vezes, mas não acho que isso seja um impedimento porque infelizmente essa insegurança e essas situações desagradáveis estão presentes no nosso dia a dia também, nas nossas cidades. Assédio, caras mexendo com a gente na rua, esse tipo de coisa.

A gente se sente insegura ao sair, principalmente à noite… ainda é tudo muito complicado para quem é mulher. Mas não acho que deixar de fazer vai resolver, né! Pelo contrário, acho que quanto mais ocuparmos nossos espaços, melhor. Nas viagens é claro que complica um pouco mais porque não conheço o lugar, não sei em que rua posso ou não entrar, então sempre acabo evitando sair à noite, mesmo durante o dia busco grupos de passeios, algumas alternativas assim que amenizam os perigos. E mesmo quando faço por conta própria procuro pesquisar bem e ficar atenta, não é nada muito diferente do que já faço na vida.

Viajar sozinha
Guarapari, Espírito Santo

QCV – Você também é jornalista e acabou transformando essa paixão por viagens em conteúdo. Assim surgiu o Mariana Viaja e, recentemente, você lançou o livro “Eu não quero chegar a lugar nenhum”. Como tem sido o processo de compartilhar suas viagens para inspirar outras mulheres a encarar o mundo também? 

Mariana – Eu sempre escrevia durante as viagens para ter como lembrança, coisa pessoal mesmo. Até que um dia veio a ideia do blog e de compartilhar com mais gente. E foi aí que percebi que a maioria das pessoas tinha mais curiosidade com o fato de eu viajar sozinha do que necessariamente sobre o que fazer nos lugares. Então comecei a focar mais nisso, a falar das minhas experiências, porque percebi que era importante levar essa inspiração a mais gente.

É bom poder usar meu lado jornalístico de uma forma positiva. Gosto de compartilhar histórias mostrando que é possível, que é mais simples do que parece, dou dicas para curtir a própria companhia no dia a dia também, falo de livros e filmes que possam inspirar, de empoderamento em geral. É legal porque acaba sendo um espaço de troca, recebo mensagens de mulheres que viajam ou que querem começar a viajar, as histórias delas me inspiram também.

Próximo à Estátua da Liberdade, em Nova York, nos Estados Unidos

A partir disso já criei projetos com o objetivo específico de mostrar como é viajar sozinha para determinados destinos, unindo o útil ao agradável. E o livro, “Eu não quero chegar a lugar algum”, surgiu a partir de algumas crônicas e reflexões que escrevo sobre minha visão de mundo, sobre ser mulher e viajar sozinha também. Acabei de lançar e estou muito feliz. Uma coisa vai complementando a outra.

QCV – Agora uma pergunta bem mais simples: quais são os seus destinos preferidos para viagens solo e por quê? 

Mariana – Alguns lugares no Brasil onde me senti muito à vontade viajando sozinha foram Aracaju, Curitiba, Salvador e São Paulo, cada um com suas particularidades. E fora do Brasil gostei muito de Portugal, além de ter a facilidade da língua. De Nova York e do Chile, que é uma opção mais perto. Mas acho que muitos fatores contribuem para gostar de um destino e isso, lógico, varia para cada pessoa e até para cada momento da vida ou o que cada um está buscando – mais agito, mais tranquilidade, mais cultura, história, etc…

Mariana em Santiago, no Chile

Sempre digo que o melhor lugar é aquele que você quer conhecer. Porque quando a gente chega a um destino que era um sonho, que tem o tipo de atrativo que a gente gosta, tudo tende a nos deixar mais felizes! Agora estou com um projeto “Viajando Sozinha no Espírito Santo“, estado no qual estou morando há um ano. A ideia é ir mostrando novos destinos por aqui e dando dicas para viajar sozinha, de ônibus, por conta própria, além de falar da percepção sobre estar sozinha em cada lugar. Tem sido legal, tenho tido um bom retorno das mulheres capixabas e de pessoas de outros estados que ainda não conhecem o ES. E é bom também porque vou conhecendo lugares lindos.

QCV – Para finalizar, você teria alguma dica para compartilhar com mulheres que sonham em viajar sozinhas, mas ainda não tiveram coragem de colocar o pé na estrada?

Mariana – Eu sempre indico começar aos poucos, seja fazendo um bate-volta em uma cidade próxima, depois um fim de semana… Ir se adaptando a estar na própria companhia. E no dia a dia também, na própria cidade, sair para jantar, ir ao cinema, porque é um processo, no início pode não ser tão confortável, mas é uma forma de autoconhecimento e quanto mais a gente pratica, mais a gente se fortalece.

Em Salvador, na Bahia

Outra dica é não ficar esperando o medo ir embora. Aquela frase “se der medo, vai com medo mesmo” é meu lema. Leve o medo com você e deixe ele por lá!

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