Jesse Koz e seu cão Shurastey faleceram em um acidente de carro nos EUA no dia 23/05/22. Ficarão para sempre na memória dos aventureiros que acompanharam essa jornada. Entrevista realizada em 2017 para o Quanto Custa Viajar:

Encarar quatro meses de estrada, com pouco conforto e muitos perrengues não parece muito tentador, mas para dar uma sacudida na rotina, nada como se jogar numa grande aventura. Com essa premissa, o brasileiro Jesse Koz e o cão Shurastey viajaram pela América do Sul a bordo de um Fusca chamado Dodongo.

Depois de mais de 20 mil quilômetros rodados e 44 destinos alcançados, a dupla encerra um ciclo. O trajeto começou no dia 5 de maio de 2017 na cidade de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, seguindo pelo Sul do Brasil até cair no Uruguai. Depois passou pelo Chile, pela Argentina e pelo Paraguai, até o roteiro se encerrar em Foz do Iguaçu.

Em entrevista ao Quanto Custa Viajar, Jesse divide conosco um balanço dessa jornada maluca. Se por um lado viajar com um amigo de quatro patas fez com que se fechassem algumas portas, impossibilitando, por exemplo, a entrada em Parques Nacionais no Brasil, Argentina e Chile, muitas outras se abriram graças ao simpático Golden Retriever, cujo nome faz alusão à música do The Clash, “Should I Stay or Should I Go”.

Creio que ele me ajudou muito mais do que me privou. Se não fosse por ele me esquentando, eu provavelmente teria morrido quando dormimos com -7ºC no sul da Argentina. As pessoas também se sentiam mais a vontade para me ajudar quando viam que eu estava viajando com o Shurastey. E sem contar que ele foi o parceiro ideal para todos os lugares e trilhas que eu fiz. Sem ele, eu não teria feito nem metade de tudo que fiz”, contou ao QCV.

Foi exatamente nas baixas temperaturas que aconteceu um dos momentos mais marcantes. Por causa de problemas no Fusca, estava parado em Rio Gallegos há mais de 10 dias e quando resolveu sair para ir até Rio Grande, a neve foi tanta, que o trajeto de quase 6 horas dobrou para 12 horas. Tudo isso para conseguir ir até Ushuaia, conhecida como a Terra do Fogo e o Fim do Mundo, na Argentina, onde pode ver a neve pela primeira vez na estrada.

“As estradas estavam congeladas e estava muito frio. Depois de dormir na casa do amigo de um amigo no meio do caminho, demoramos mais 8 horas para chegar em Ushuaia. Quando finalmente chegamos ao portal da cidade, por volta das 6 horas da tarde, eu não me aguentei e dei um berro! Os policiais vieram ver o que estava acontecendo. Era eu, feliz demais por finalmente ter chego no fim do mundo.”

O cachorro de quase dois anos de idade chegou também a cair num rio congelado em El Calafate, na Patagônia argentina. “O Shurastey reserva várias e boas trapalhadas. Nesse caso, ele foi indo mais pro meio do gelo, que acabou quebrando. Não foi nada muito preocupante. Na verdade foi engraçado. O rio era raso e ele conseguiu se sair muito bem depois disso”, contou.

Os verdadeiros desafios, porém, foram mesmo com o Fusca 1978. A caranga, que já era de Jesse antes dos planos de viagem começarem, aguentou o tranco, mas não sem dar certos desafios no meio do caminho. “O carro deu alguns problemas no motor, que tiveram que ser resolvidos em uma terra onde não existe Fuscas e muito menos peças para eles. Mas esses problemas já eram esperados, e obviamente eu não estava preparado.

Sem entender de mecânica e sem falar espanhol, o curitibano teve que se virar de diversas formas. “Era exatamente para isso que eu havia saído [de casa], para aprender nas dificuldades e quando o problema aparecesse. Hoje, depois de quatro meses, consigo me comunicar bem e entender quase tudo o que dizem em espanhol. Acabei aprendendo na marra!”, constatou o viajante.

Os perrengues não param por aí, não. No início da viagem, ele também relatou que chegou a perder oito quilos em menos de um mês. Isso porque a vontade de economizar deveria ser maior do que a fome! Ou seja, por um período, ele se alimentava basicamente de miojo.

Depois de passar noites dentro do Fusca e dormir em barracas, Jesse conheceu o couchsurfing, modalidade que os mochileiros adoram. A plataforma online forma uma comunidade de pessoas que recebem viajantes em suas casas e não cobram nada por isso. Além de reduzir os custos, proporciona uma troca de culturas e novos amigos. E, vamos combinar, arrumar um cantinho para dormir com mais conforto não é nada mal!

Mas e aí, será que conseguiu poupar dinheiro? Ele acredita que o saldo foi positivo. Após se cansar da rotina exaustiva de um vendedor de shopping, emprego em que estava há sete anos, aplicou suas táticas de vendas para se livrar de seus pertences e realizar o sonho de viajar.

Após juntar aproximadamente R$ 8 mil na conta, Jesse concluiu que o maior gasto foi com a gasolina, uma média de R$ 5 mil. “Gastar menos de R$ 3 mil com peças e manutenção do carro, alimentação, hospedagem e afins em quatro países durante quatro meses…é difícil, hein!”, disse ele ao relatar os cálculos. E se orgulha de suas proezas, é claro: “com R$ 2 mil você não vai até Bariloche por uma semana. Eu fui e fiquei três dias gastando 500 pesos com gasolina para rodar dentro da cidade”.

Agora, ele se dedica a escrever um livro sobre essa grande aventura, mas já está pensando na próxima, rumo ao Alasca. “Foi tudo muito lindo, mas o dinheiro acabou. Agora estou em busca de apoiadores e patrocinadores que possam me ajudar. E estou vendendo canecas e chaveiros para financiar o restante”.
Os custos com o Fusca na volta para o Brasil foram altos, já que o motor teve de ser refeito. Porém, nesse momento, o maior obstáculo da próxima parada não é nem monetário e sim burocrático. “Agora toda e qualquer ajuda é bem vinda, mas o principal desafio da nova viagem é a questão do visto. Se eu não conseguir, vou até o México. Caso consiga, nada poderá nos parar até o Alasca!, argumentou Jesse, com Shurastey na torcida.

Post por Brunella Nunes
Fotos: Jesse Koz

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